quinta-feira, 16 de setembro de 2010

Sabedoria Indígena

Uma noite, um velho índio falou ao seu neto sobre o combate que

acontece dentro das pessoas.

Ele disse:

- A batalha é entre os dois lobos que vivem dentro de todos nós.


Um é Mau!
É a raiva, inveja, ciúme, tristeza, desgosto, cobiça, arrogância,
pena de si mesmo, culpa, ressentimento, inferioridade, mentiras,
orgulho falso, superioridade e ego.


O outro é Bom!
É alegria, fraternidade, paz, esperança, serenidade, humildade, fé,
bondade, benevolência, empatia, generosidade, verdade, compaixão...


O neto pensou nessa luta e perguntou ao avô:

- Qual lobo vence?


O velho índio respondeu:


- Aquele que você alimenta!

segunda-feira, 13 de setembro de 2010

O golpe midiático

O futuro do Brasil parece que se resume, às vésperas de uma eleição presidencial, a apenas uma questão: quem teve a iniciativa de pedir a quebra de alguns sigilos fiscais, que deveriam estar sob a guarda segura da Receita Federal. Trata-se de um crime e, como tal, a legislação prevê os trâmites necessários o competente processo e, por fim, a decisão, de atribuição de responsabilidades e possíveis punições. Coisa simples, que deveria ocupar não mais do que meia dúzia de servidores da Receita, da Polícia e do Judiciário, para o correto levantamento dos dados necessários ao julgamento do que de fato aconteceu. Enquanto isso, o(a)s candidato(a)s usariam todo o tempo de que dispõem para apontar soluções para os problemas – que não são poucos – do país.

No entanto, a mídia transformou o caso numa espécie de plebiscito eleitoral. Engana-se quem confunde tal obsessão com jornalismo investigativo. Acorda-se e o destaque do noticiário é a quebra de sigilo de pessoas ligadas ao PSDB e à filha de um dos candidatos. Ao meio-dia, mais generosos espaços. À noite, ninguém dorme sem novas informações e com direito à indignação dos comentaristas de plantão. A candidata do PV é submetida a uma intensa sabatina de perguntas por um veículo das Organizações Globo e o que vai ao ar, nos telejornais da emissora, é só um assunto: o que ela tem a dizer sobre a quebra de sigilo da Receita. Em resumo: o que em qualquer democracia seria tratado como um caso policial, até que surjam provas em outra direção, no Brasil de uma mídia muito pouco isenta, vira um escândalo que pode ter influência decisiva na eleição para a presidência. Há uma overdose de atenção ao caso que nenhum manual de jornalismo explica.

Falar sobre o futuro da economia e da qualidade de vida? Para quê? Debater a melhoria da educação? Por que perder tempo? Discutir sobre novos investimentos em saúde pública? Que nada! O que interessa nessas eleições, para a grande mídia, é saber sobre cidadãos que, por conta própria ou a mando de alguém, resolveram vasculhar dados de pessoas ligadas a partidos políticos e outras nem tanto.

O fato aconteceu há um ano, longe do fervor da atual campanha, mas a mídia resolveu torná-lo onipresente, a qualquer custo, diante da falta de perspectiva do candidato que deveria vencer um “poste”, mas que parece perdeu-se na direção.

Sabe-se que há um militante do PT (filiado ou que tentou se filiar, há controvérsia) envolvido na procuração falsa que permitiu o acesso aos dados. A Receita Federal, que recebe pedidos desse tipo todos os dias e tem por obrigação entregá-los quando o documento do solicitante é idôneo (ou parece), passou de vítima à ré. E se, eventualmente, se comprovar que houve má-fé também por parte de um ou mais funcionários, toda instituição não merece sentar no banco dos réus. Idem o PT ou qualquer organização que já teve um de seus membros cometendo algum tipo de crime. Se um funcionário de alguma empresa privada comete um delito, é motivo para atacar toda a empresa? Nenhum comentarista “global” se atreveria. Jornalistas bem pagos sabem muito bem a quem “emprestam” o seu talento. São corajosos... É mera coincidência que suas críticas, com frases de efeito, entonação correta e estudado olhar teatral, seja exatamente como seus patrões gostariam de ler, ver e escutar.

Não importa que as pesquisas digam que o atual governo só é ruim ou péssimo para 4% da população brasileira. O país que a grande mídia vê é outro. E está cada vez pior.

Não importa que espionagens, dos mais diversos tipos, já ocorreram em outros órgãos e em outras épocas. E que até mesmo no presente momento, um caso semelhante é investigado no Rio Grande do Sul, onde um sargento que estava lotado na Casa Civil do governo estadual, que é do PSDB, vasculhou dados de políticos, como os do ex-ministro da Justiça e candidato ao governo gaúcho, Tarso Genro, do PT, do senador Sérgio Zambiasi, do PTB, filhos de políticos, jornalistas, delegados, oficiais da polícia e das forças armadas e de uma longa lista que inclui também uma desembargadora. Não é desejável que tais fatos aconteçam, mas não dá para fazer cara de quem nunca viu isto antes.

Reportagem do SBT, em 2009, informava que dados sigilosos de 100 milhões de brasileiros – incluindo o presidente Lula, dona Marisa, José Serra e sua filha, ministros do Executivo e do Judiciário, entre outros –, inclusive com endereço e telefone celular, podiam ser comprados nas ruas de São Paulo (confira em: www.youtube.com/watch?v=pIKDfaN5K5A&feature=related  ).

Por isso, não seria aconselhável tecer conclusões precipitadas, sem o mínimo de bom senso e inteligência. Como se diz nas redações, a folha em branco aceita tudo. Primeiro se acusa, em espaços generosos nos jornais, revistas, sites e nos noticiários de rádio e TV. Depois, se o especulado não confere com a verdade, dá-se, quando muito, meia dúzia de linhas para um desmentido. E seguem os caçadores em busca da próxima caça. E do próximo “escândalo”.

Jornalistas e intelectuais têm denunciado, em veículos de comunicação muito menos poderosos do que a “grande mídia”, a falta de pudor dos donos dos meios de comunicação e seus “cães de guarda”. É quase nada diante da enxurrada de argumentos toscos, torpes e tortos, mas críveis para boa parte daqueles que não dispõem de outros meios para melhor se informar.

Um exemplo da manipulação a que tem sido submetida a sociedade brasileira foi a manchete do jornal O Globo de 21/7/2010: “Em carta, CNBB pede que fiéis não votem em Dilma” (http://oglobo.globo.com/pais/eleicoes2010/mat/2010/07/21/em-carta-cnbb-pede-que-fieis-nao-votem-em-dilma-917208359.asp). E transcreve, na íntegra a suposta carta da CNBB, assinada por Dom Luiz Gonzaga Bergonzini. O mais ingênuo foca, ao ler o texto, perceberia que é a opinião isolada de um religioso, mas a manchete foi categórica ao oficializar uma decisão de toda a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil.

Por estranhar o fato, enviei email para a CNBB pedindo a confirmação ou desmentido. A resposta do assessor de Imprensa, padre Geraldo Martins: “A notícia desta carta não é verdadeira. A CNBB não emitiu nenhuma carta com tais orientações. A única declaração da CNBB sobre política foi divulgada no mês de maio, durante a Assembleia dos Bispos e está em nosso site (http://www.cnbb.org.br/site/imprensa/notas-e-declaracoes/3339-declaracao-sobre-o-momento-politico-nacional). O conteúdo a que se refere a notícia diz respeito a um artigo do bispo de Guarulhos, que não reflete a posição da CNBB.”

O jornalista Luís Nassif (Blog Luis Nassif Online), acredita que há algo pior sendo urdido nos bastidores dos grandes jornalões e na principal emissora de TV do país. Para ele, “a quebra de sigilo é apenas uma peça do jogo, preparando a jogada final.” Próximo à data de 3 de outubro, viria o golpe definitivo: “Provavelmente alguém seria apresentado como ex-companheiro de guerrilha, arrependido, que, em pleno Jornal Nacional, diria que Dilma participou da morte de fulano ou beltrano. Choraria na frente da câmera, como o José Serra chora. Aí a reportagem mostraria fotos da suposta vítima, entrevistaria seus pais e se criaria o impacto. No dia seguinte, sem horário gratuito não haveria maneiras de explicar a armação em meios de comunicação de massa. Será um desafio do jornalismo brasileiro saber quem serão os colunistas que endossarão essa ignomínia - se realmente vier a ocorrer -, quem serão aqueles que colocarão seu nome e reputação a serviço desse lixo.”

Ora, tal como na política, o que menos falta são candidatos. O prêmio, afinal, costuma ser bem generoso. E “cães” são fiéis a seus donos.

Resta saber se os proprietários de grandes veículos de comunicação se arriscarão a pagar o preço de uma acentuada perda de credibilidade, matriz de seus negócios. E de um desfecho imprevisível para um Brasil cada vez mais maduro, que parece não se deixar convencer facilmente pela manipulação midiática.
 
 
Autor: Celso Vicenzi - Jornalista
Fonte: http://www.acontecendoaqui.com.br/

BAR RUIM É LINDO, BICHO

* Por Antonio Prata

Eu sou meio intelectual, meio de esquerda, por isso freqüento bares meio ruins.
Não sei se você sabe, mas nós, meio intelectuais, meio de esquerda, nos julgamos a vanguarda do proletariado, há mais de cento e cinqüenta anos.

(Deve ter alguma coisa de errado com uma vanguarda de mais de cento e cinqüenta anos, mas tudo bem).

No bar ruim que ando freqüentando ultimamente o proletariado atende por Betão - é o garçom, que cumprimento com um tapinha nas costas, acreditando resolver aí quinhentos anos de história.

Nós, meio intelectuais, meio de esquerda, adoramos ficar "amigos" do garçom, com quem falamos sobre futebol enquanto nossos amigos não chegam para falarmos de literatura.

- Ô Betão, traz mais uma pra a gente - eu digo, com os cotovelos apoiados na mesa bamba de lata, e me sinto parte dessa coisa linda que é o Brasil.

Nós, meio intelectuais, meio de esquerda, adoramos fazer parte dessa coisa linda que é o Brasil, por isso vamos a bares ruins, que têm mais a cara do Brasil que os bares bons, onde se serve petit gâteau e não tem
frango à passarinho ou carne-de-sol com macaxeira, que são os pratos tradicionais da nossa cozinha. Se bem que nós, meio intelectuais, meio de esquerda, quando convidamos uma moça para sair pela primeira vez, atacamos mais de petit gâteau do que de frango à passarinho, porque a gente gosta do Brasil e tal, mas na hora do vamos ver uma europazinha bem que ajuda.

Nós, meio intelectuais, meio de esquerda, gostamos do Brasil, mas muito bem diagramado. Não é qualquer Brasil. Assim como não é qualquer bar ruim. Tem que ser um bar ruim autêntico, um boteco, com mesa de lata, copo americano e, se tiver porção de carne-de-sol, uma lágrima imediatamente desponta em nossos olhos, meio de canto, meio escondida.

Quando um de nós, meio intelectual, meio de esquerda, descobre um novo bar ruim que nenhum outro meio intelectual, meio de esquerda, freqüenta, não nos contemos: ligamos pra turma inteira de meio intelectuais, meio de esquerda e decretamos que aquele lá é o nosso novo bar ruim.

O problema é que aos poucos o bar ruim vai se tornando cult, vai sendo freqüentado por vários meio intelectuais, meio de esquerda e universitárias mais ou menos gostosas. Até que uma hora sai na Vejinha como ponto freqüentado por artistas, cineastas e universitários e, um belo dia, a gente chega no bar ruim e tá cheio de gente que não é nem meio intelectual nem meio de esquerda e foi lá para ver se tem mesmo artistas, cineastas e, principalmente, universitárias mais ou menos gostosas. Aí a gente diz: eu gostava disso aqui antes, quando só vinha a minha turma de meio intelectuais, meio de esquerda, as universitárias mais ou menos gostosas e uns velhos bêbados que jogavam dominó. Porque nós, meio intelectuais, meio de esquerda, adoramos dizer que freqüentávamos o bar antes de ele ficar famoso, íamos a tal praia antes de ela encher de gente, ouvíamos a banda antes de tocar na MTV. Nós gostamos dos pobres que estavam na praia antes, uns pobres que sabem subir em coqueiro e usam sandália de couro, isso a gente acha lindo, mas a gente detesta os pobres que chegam depois, de Chevette e chinelo Rider. Esse pobre não, a gente gosta do pobre autêntico, do Brasil autêntico. E a gente abomina a Vejinha, abomina mesmo, acima de tudo.

Os donos dos bares ruins que a gente freqüenta se dividem em dois tipos: os que entendem a gente e os que não entendem. Os que entendem percebem qual é a nossa, mantêm o bar autenticamente ruim, chamam uns primos do cunhado para tocar samba de roda toda sexta-feira, introduzem bolinho de bacalhau no cardápio e aumentam cinqüenta por cento o preço de tudo. (Eles sacam que nós, meio intelectuais, meio de esquerda, somos meio bem de vida e nos dispomos a pagar caro por aquilo que tem cara de barato). Os donos que não entendem qual é a nossa, diante da invasão, trocam as mesas de lata por umas de fórmica imitando mármore, azulejam a parede e põem um som estéreo tocando reggae. Aí eles se dão mal, porque a gente odeia isso, a gente gosta, como já disse algumas vezes, é daquela coisa autêntica, tão Brasil, tão raiz.

Não pense que é fácil ser meio intelectual, meio de esquerda em nosso país. A cada dia está mais difícil encontrar bares ruins do jeito que a gente gosta, os pobres estão todos de chinelos Rider e a Vejinha sempre alerta, pronta para encher nossos bares ruins de gente jovem e bonita e a difundir o petit gâteau pelos quatro cantos do globo. Para desespero dos meio intelectuais, meio de esquerda que, como eu, por questões ideológicas, preferem frango à passarinho e carne-de-sol com macaxeira (que é a mesma coisa que mandioca, mas é como se diz lá no Nordeste, e nós, meio intelectuais, meio de esquerda, achamos que o Nordeste é muito mais autêntico que o Sudeste e preferimos esse termo, macaxeira, que é bem mais assim Câmara Cascudo, saca?.

-Ô Betão, vê uma cachaça aqui pra mim. De Salinas, quais que tem?


(Texto integrante do volume As Cem Melhores Crônicas Brasileiras,organizado por Joaquim Ferreira dos Santos.)
Imagem: Boteco, João Werner