segunda-feira, 18 de maio de 2009

Internet: projeto de lei que tramita na Câmara fere direitos fundamentais


Escrito por Mariana Tamari
14-Mai-2009

O surgimento da rede mundial de computadores, mais conhecida como Internet, revolucionou a comunicação entre os seres humanos de todo planeta. Hoje, é possível ouvir música islandesa, baixar filmes iranianos e saber o que se passa do outro lado do mundo, lendo diariamente notícias em urdu ou em japonês. Além da ampliação do acesso, com a Internet deixamos de ser apenas receptores dos produtos informacionais e passamos a ser também produtores de notícias, de vídeos e de áudios que alimentam um gigantesco emaranhado de máquinas e pessoas. Surgem a blogosfera e as teias de redes sociais, como Facebook, Youtube e Orkut, que colocam as pessoas em um outro patamar comunicacional e elevam exponencialmente as possibilidades de trocas.

Para compreender o cenário acima descrito, nem mesmo o menos informatizado dos leitores precisa fazer esforço. A internet se disseminou como uma epidemia, invadindo casas e cotidianos de maneira avassaladora, em especial nos últimos 15, 20 anos. E essa "invasão" só foi possível devido à lógica de liberdade e colaboração sob a qual a rede mundial de computadores foi construída. Sem os preceitos básicos de acesso quase infinito ao conteúdo da rede e aos processos de criação coletiva que ela proporciona, sabe-se lá onde teria parado o seu desenvolvimento. Assim, é fácil entender como ela se disseminou tanto, tomando nossas mentes e inundando nosso dia-a-dia, e como evoluiu, sendo moldada pelo esforço humano coletivo.

Mas, ao mesmo tempo em que a rede amplia nossas possibilidades de comunicação, de produção e acesso à informação, aumenta a comunicação entre pessoas e faz evoluir o conhecimento, ela reflete também as características da sociedade humana, sua progenitora, que está longe de ser perfeita e unicamente positiva. Seu sistema baseado na comunicação distribuída, que permite uma interconectividade relativamente horizontal entre as máquinas, pode facilmente dar lugar a instrumentos de monitoramento e controle bastante refinados.

Desta maneira, o futuro da Internet apresenta-se como um importante campo das lutas políticas. Será ele forjado como um recurso de comunicação alternativa e de livre produção de conhecimentos? Ou se transformará em um vasto dispositivo a serviço da vigilância estatal e corporativa?

É dentro deste cenário, ao mesmo tempo complexo e novo, que gera perplexidade, excitação e ansiedade, mas também medo, que se monta o palco de uma disputa travada aqui no Brasil, quase silenciosa, entre as forças conservadoras e aqueles que sabem da importância de manter livre e cada vez mais acessível a informação que circula na rede.

No Brasil, um Projeto Substitutivo sobre crimes na Internet, aprovado e defendido pelo Senador Eduardo Azeredo (PSDB-MG), está para ser votado na Câmara de Deputados. Trata-se da aglutinação de três Projetos de Lei que já tramitavam no Senado (PLS 76/2000, PLS 137/200 e PLC 89/2003). Todos tinham como objetivo tipificar condutas realizadas mediante uso de sistema eletrônico, digital ou similares, de rede de computadores, ou que sejam praticadas contra rede de computadores, dispositivos de comunicação ou sistemas informatizados e similares, além de dar outras providências.

Esse substitutivo, caso seja aprovado, tornará crime inúmeras de nossas práticas virtuais cotidianas. Ele atende fundamentalmente a interesses de bancos que têm sofrido prejuízos com fraudes pela internet e a reivindicações da indústria de direito autoral dos Estados Unidos, que exige a criminalização da quebra de travas tecnológicas.

O objetivo velado do substitutivo do senador Azeredo, já conhecido também como o AI-5 Digital, é, portanto, tornar suspeitas as redes P2P, impedir a existência de redes abertas e reforçar o DRM (Gerenciador Digital de Direitos, na sigla em inglês), que impedirá o livre uso de aparelhos digitais. Entre as disposições do AI-5 Digital, como vem sendo chamado o PL por seus opositores, uma das mais preocupantes é a intenção de transformar os provedores de acesso em uma espécie de polícia privada. Trata-se, portanto, de um projeto que coloca em risco a privacidade dos internautas e que busca restringir o acesso irrestrito a bens informacionais de valor inestimável para o desenvolvimento da cultura. Ele instaura uma atmosfera de vigilantismo que vai contra toda a possibilidade de avanço tecnológico da rede e, se aprovado, elevará e muito o custo de comunicação no Brasil, que já é bastante alto.

Trata-se de uma matéria urgente, pois faltam poucos passos para a votação final que pode tornar Lei o projeto considerado por muitos especialistas como inconstitucional, vigilantista e violador da privacidade individual. Já votado em Plenário no Senado, no dia 5 de março, o deputado conservador ligado ao PSDB, Regis de Oliveira (PSC-SP), conseguiu aprovar seu parecer favorável ao projeto do Senador Azeredo na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJC) da Câmara dos Deputados. Agora ele passa por análise das Comissões de Ciência e Tecnologia daquela casa e então será encaminhado para votação em Plenário. Falta muito pouco para a aprovação do AI-5 Digital.
Fonte: Correio da Cidadania

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